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Mulheres devem dominar a medicina até 2030, indica estudo do Ministério da Saúde

 Mulheres devem dominar a medicina até 2030, indica estudo do Ministério da Saúde
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Em nove anos, as mulheres serão maioria entre os médicos e mais de 80% dessas profissionais, em 2030, terão entre 22 e 45 anos. É o que indica estudo que subsidia o Plano Nacional de Fortalecimento das Residências em Saúde do Ministério da Saúde. De acordo com o órgão, a pesquisa tem o objetivo de contribuir com o planejamento de políticas públicas de recursos humanos que atendam às reais necessidades da população e do sistema de saúde. A análise, publicada no Informe Técnico nº 4/2021, ressalta, ainda, um aumento expressivo da população de médicos.
O estudo é uma parceria entre o Ministério da Saúde, por meio da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES), a Universidade de São Paulo (USP) e a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS). Segundo o levantamento, de 2010 a 2020, o número de profissionais passou de 315.902 para 487.275 e, segundo o ministério, deve chegar a 815.570 até 2030.
O avanço do público feminino vem se delineando no Brasil desde 2010, destaca a publicação, quando as mulheres já eram mais de 50% do total de profissionais nos cursos de medicina. O estudo conclui que a maior proporção de mulheres na população de médicos pode ser explicada pela evolução das pirâmides etárias ao longo do tempo.
Proporção
Em 2010, a população de homens era proporcionalmente maior na faixa entre 51 a 55 anos, enquanto a base da pirâmide era mais povoada pelas jovens médicas, sobretudo na faixa dos 26 a 30 anos de idade. Em 2020, a faixa etária de 51 a 55 anos estava com proporção semelhante de médicos e médicas, enquanto nas faixas de 26 a 30 anos e 31 a 35 anos as mulheres eram 12% mais prevalentes que os homens. A pesquisa assinala, ainda, que haverá uma mudança na relação de médicos por habitante. As projeções apontam que, no Brasil, essa relação será de 3,63 em 2030 — quase o dobro do registrado em 2010, de 1,90.
“Nas universidades, muito antes da pandemia do coronavírus, já éramos maioria nos cursos de medicina. As dificuldades são grandes. Sabemos que muitas não têm condições, não existem cotas exclusivas para mulheres, disputamos os espaços com os homens, mas seguimos mostrando nossa competência”, afirmou a infectologista Eliana Bicudo, membro da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) e professora da Universidade de Brasília (UnB) e do Centro de Tecnologia e de Educação Profissional (Ceteps).
Julival Ribeiro, também membro da SBI e ex-diretor-geral do Hospital de Base do Distrito Federal, comemorou os dados. “Espero que seja realidade. Li, certa vez, um artigo de uma revista médica dos Estados Unidos que dizia que os pais médicos não aconselhavam os filhos a seguir a carreira, porque nossa vida não é fácil. Vivemos sob muita pressão”, reconheceu. A única preocupação dele é com a formação profissional do Brasil. “Estou sempre perguntado quem será o meu médico de amanhã. Nos últimos anos, foram abertas muitas faculdades sem a correspondência da residência médica. Me assusta como será, não só a qualidade técnica, como o dia a dia”, disse Ribeiro.
Remuneração
A notícia da entrada mais consistente de mulheres jovens na medicina seria, por outro lado, mais animadora se os ganhos mensais fossem iguais entre os gêneros. Pelos últimos dados disponíveis da Pesquisa Demografia Médica no Brasil 2018, da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) com apoio do Conselho Federal de Medicina (CFM) e do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), embora o público feminino esteja em crescimento, o salário ainda é menor aos dos homens que ocupam as mesmas posições.
A diferença na remuneração de homens e mulheres é bastante significativa. Em todos os cenários analisados, a chance de os profissionais homens receberem mais do que as colegas mulheres é maior. Em três categorias salariais mais baixas, o percentual de mulheres é de quase 80%, já nas três categorias mais bem remuneradas a prevalência masculina é de 51%.
Entre os profissionais que trabalham de 20 e 40 horas semanais, apenas 2,7% delas recebiam cerca de US$ 10.762 por mês (cerca de R$ 42.780), em comparação com 13% deles. A probabilidade de homens receberem o nível salarial mais alto — acima de US$ 10.762 — é de 17%, enquanto a de mulheres é de apenas 4%. A desigualdade salarial entre os gêneros persistiu em relação à carga horária, atendimento em consultório e plantões, assinalou o estudo.
Outra questão são os cargos de liderança. A pesquisa da FMUSP também ressaltou que as mulheres estão em especialidades como clínica geral, pediatria, medicina da família, ginecologia e obstetrícia, que pagam menos se comparadas com especialidades cirúrgicas, ocupadas em sua maioria por homens. O estudo apontou ainda que eles ocupam posições de liderança com mais regularidade do que as mulheres na área médica.
“O que queremos — e vamos conseguir — é equidade. Nem maior, nem menor salário, de acordo com o gênero. Profissionais competentes devem ter a mesma remuneração”, destaca Eliana Bicudo. Embora os homens ainda sejam maioria entre os profissionais de medicina (54,4%), esse número vem caindo ao longo dos anos e as mulheres já são predominantes entre os profissionais mais jovens, sendo 57,4% no grupo até 29 anos e 53,7% na faixa entre 30 e 34 anos, conforme a pesquisa de 2018.
Claudia Xavier Oliveira, 23 anos, concluiu o curso de biomedicina no Centro de Ensino Unificado de Brasília (Ceub), no final de 2019. Ela disse que vários colegas homens rapidamente se empregaram e ascenderam também em tempo bem menor que as moças. “É impressionante como isso acontece. As desculpas são diversas. Há quem diga que eles são melhores, e, como o julgamento é subjetivo, nos coloca em uma encruzilhada. Outras vezes alegam, pasmem, que precisam sustentar a família, como se nós não precisássemos”, pondera Claudia. “Muitas vezes, trabalhamos mais e não há o menor reconhecimento”, lamenta.
Prima de Claudia, Fernanda Monteiro Oliveira, 25, também está próximo de encerrar os estudos de medicina, na Universidade de Brasília (UnB). “É claro que não vamos desistir e não vamos deixar, dentro do possível, que percebem que isso nos machuca. Mas não é fácil ver que não somos indicadas para cargos ou para situações de destaque, mesmo quando merecemos, apenas porque somos mulheres”, admite. “Muita coisa já mudou, eu sei. Mas eu pensava que essa diferença já tinha sido superada pela minha geração”, completa Fernanda.

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